Camisa de força/forças

Camisa de lona com mangas muito compridas, usada para conter uma pessoa violentamente psicótica.

A camisa de força é descrita no livro de David Macbride (1772), mas outros autores afirmam que ela foi inventada por Guilleret (1790), estofador do hospital de Bicêtre (França) e batizada de camisole de force

Apesar da sua paternidade não estar clara, o início do uso da camisa de forças fica associada ao psiquiatra francês Philippe Pinel (1745-1826), um dos fundadores da psiquiatria contemporânea, na sequência da tentativa de estabelecer um tratamento mais humano para pacientes com transtornos mentais, em detrimento dos “tratamentos” cruéis adotados em França no século XIX. É através da mudança de atitude na abordagem destas pessoas, ajudado por Jean Baptiste Pussin (1746–1811) percursor da Enfermagem Psiquiátrica, que Pinel terá introduzido o uso da camisa de força (Pereira, 2004).

A camisa de forças, que na época vitoriana foi utilizada como instrumento de tortura, é uma espécie de camisa feita de tecido do tipo “lona”, resistente, com mangas muito compridas e fechadas, que ultrapassam as pontas dos dedos do paciente. Estas permitiam que os braços se cruzassem contra o peito e as extremidades das mangas fossem apertadas atrás das costas, com firmeza, com o objetivo de o maniatar, restringindo os seus movimentos. Por vezes tinha uma argola à qual se ligava uma corda, ou cadeado, para ser amarrada nas costas. Este dispositivo era usado isoladamente ou em simultâneo com outro tipo de estratégias de imobilização como a “cadeira forte”, “peias”, correntes, algemas e celas solitárias, sendo considerada uma forma de contenção física mais transitória, menos dolorosa e menos excludente que outros dispositivos usados à época (Guimarães, Borba, Larocca, & Maftum, 2013).

A camisa de forças é parte inegável da história da Psiquiatria, que abrangia um conjunto de medidas de repressão, impregnadas nas práticas dos “asilos”, “hospícios”, “hospitais de alienados” e, mais tarde, dos “hospitais psiquiátricos”, denominações dadas a instituições que albergavam pessoas com doenças mentais (Pereira, 2015).

A implementação deste tipo de medidas era amplamente aceite, com o objetivo de conter os pacientes em estado de excitação ou furor, agitação psicomotora, agressividade, que agrediam os outros ou se auto-agrediam e quando existia a necessidade de estabelecer limites (Pereira, 2015).

Os doentes mentais ficavam apenas com os braços amarrados, mas conseguiam andar. Esse tipo de contenção não evitava por completo que a pessoa agredisse os outros, pois como os membros inferiores ficavam livres, poderiam ser utilizados. No entanto, constituía grande risco de queda e ferimentos, especialmente no rosto, uma vez que prejudicava o equilíbrio e diminuía a possibilidade de o paciente ao cair se proteger com os braços. No caso de queda do indivíduo, por vezes, era necessário suturar as lesões.

A camisa de força e a reclusão, não podiam ser empregues sem autorização de um clínico, e regra geral, a sua adoção era delimitada no tempo não podendo exceder dois dias por cada aplicação (Pereira, 2015).

Com o desenvolvimento da Psiquiatria científica, o aparecimento dos psicofármacos, o desenvolvimento da psicoterapia e o emergir de diferentes tipos de abordagens terapêuticas, em países desenvolvidos, nomeadamente em Portugal, a adoção das medidas descritas anteriormente tornou-se, cada vez mais, de carácter excecional, e algumas acabaram mesmo por se extinguir, como é o caso do uso da camisa de força. Contudo, não se pode deixar de referir que em alguns países, algumas destas abordagens ainda são utilizadas.

Referências Bibliográficas

Campbell, R. J. (2009). Dicionário de psiquiatria (8ª ed.). Artmed.
Guimarães, A. N., Borba, L., Larocca, L., Maftum, M. (2013). Tratamento em saúde mental no modelo manicomial (1960 a 2000): histórias narradas por profissionais de enfermagem. Texto Contexto–Enfermagem, 22(2), 361-369. 
Pereira, J. M. M. (2015). A Psiquiatria em Portugal. Protagonistas e história conceptual (1884-1924) [Tese de Doutoramento, Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra]. Repositório da Universidade de Coimbra. 
Pereira, M. E. C. (2004). Pinel – a mania, o tratamento moral e os inícios da psiquiatria contemporânea. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 7(3), 113-116.

Camisa de força ou Camisa de forças pertencente ao espólio museológico da ESEP.

Tradução: Straitjackets (Inglês) / Camisole de force (francês)